segunda-feira

Cheiro de cavalo

Gosto de cavalos. Gosto de seu cheiro, daquele barulho típico que fazem ao resfolegar. Me encanta o porte, a imponência dos músculos, o ruído de cascos batendo no chão. Também gosto da maneira como tremem a pelagem involuntariamente. Cavalos são majestosos. Selvagens, correm nas estepes da Mongólia e se deixam domesticar. Mas quando olho para eles sei que não é inteiramente assim. Quando relincham, bem alto, percebo em suas narinas o vento da liberdade.Vê-los em movimento me comove. Acho que cavalos são ancestrais.

Meu contato com cavalos começou na infância, em Salvador. O Pônei Clube era uma chácara que meu pai, seu irmãos e alguns amigos alugaram para reunir a família, os filhos de cada um e os agregados que sempre apareciam. Certo dia correu o boato que um menino tinha sido mordido no braço ao desmontar. Corri para o piquete e enquanto espiava o movimento pelo intervalo das tábuas brancas vi, com meus infantis, um cavalo virar o pescoço na direção de quem descia de suas costas, certamente na tentativa de morder a canela do desavisado. Desse dia em diante, quando ia passear no Estrelinha, o cavalo mais manso do Pônei, só aceitava se alguém puxasse a rédea.

À medida que mudávamos de cidade, novas experiências se somavam à do Clube. Certo final de semana fomos para Águas de Lindóia. Tudo corria bem até que fui descoberta por uma amiga do colégio que passava os dias com a família e logo me convidou para passear nos pangarés com seu irmão. Senti um frio na barriga, mas não tive coragem de negar. Como o azar persegue o medroso, tive a sorte de montar num bicho que estava com a sela meio solta. Na primeira curva a amiga (da onça) começou o galope, seguida do irmão, aguçando o instinto da minha montaria que foi atrás, pegando velocidade, afrouxando cada vez mais a sela que escorregava para o lado, me levando junto. Sem saída, eu gritava – Socoooorro! Socoooorro!

Anos depois, cineasta, sonhava ser documentarista quando apareceu a oportunidade de ir ao Pantanal filmar um grupo de franceses que vinha ao Brasil fazer turismo equestre, tudo patrocinado por criadores da raça Mangalarga. Nesses dias em que dormi em rede, no meio do mato e seguia de pé na boléia do jeep, com a câmera na mão, o medo dos cavalos foi dando lugar a um respeito que veio da convivência e da paciência de Stéphane, o guia e cavaleiro que não saiu do meu lado quando acompanhei o grupo num autêntico cavalo pantaneiro. Na trilha, com os bichos emparelhados, ele me ensinava a usar as rédeas, acompanhar o galope com o corpo, posicionar as pernas e, principalmente, a confiar. Percebi como é incrível sensação de ser uma unidade com o cavalo, galopando em seu ritmo. Ao mesmo tempo em que deixava o animal me levar também era eu que o conduzia.
Hoje caminho no meu bairro pela calçada que beira o muro alto do Clube Hípico, sinto o cheiro dos cavalos do lado de lá, patas que trotam cadenciadas, escuto um leve bufar. Alguma coisa reverbera em mim.








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