segunda-feira

A florista

Confesso que não sou grande compradora de flores, mas numa das calçadas do meu bairro tem uma florista e sempre que passo por ela sinto um apelo interno para incorporar esse hábito na minha vida.

Salas com vasos floridos são diferentes daquelas que, como a minha, tem lá seu vaso num canto, sem sentido, tomando pó sobre uma mesa de apoio, e nada mais. Vasos que cumprem seu destino contam pequenas histórias, falam do tipo de casa, do tipo de gente que mora nela e do momento que estão vivendo. Rosas colombianas, por exemplo, não as imagino em apartamentos miúdos, as vejo em salas amplas de pessoas apaixonadas. Lírios vivem em casas de janelas abertas, cravos pertencem a pessoas um pouco rígidas, crisântemos amarelos enfeitam a alma de quem está feliz, flores do campo não estão em vasos de prata. E os vasos! Existe uma variedade deles – a garrafinha vazia de pimenta que recebe uma flor solitária, as garrafas azuis nas soleiras que miram o Mediterrâneo, os chineses de porcelana impecável, os de Murano, de vidro, de cristal, de barro, lisos, foscos, transparentes. Uma pessoa poderia viajar pelo mundo em busca de vasos!

Imagino que as flores causam uma revolução silenciosa em nossas vidas. Nos interessamos por seus nomes, sua origem, quanto tempo duram. Esboçamos arranjos imaginários quando as vemos. Passamos a flertar com botões, intuindo o desabrochar que caminhará tímido até o auge de cores e viço. E as levamos nos braços para casa como um ser vivo que acolhemos com expectativa, para aparar pontas, deitar em água fresca, transformar em buquê o que era maço.

Prezo a florista, com seu perfume de século passado, esperando na calçada. Me apego a esse romantismo de um tempo em que as pessoas diziam bom dia! e trocavam notícias, sem compromisso, olhando-se nos olhos (e não para o celular) só porque era costume fazer isso – ser cortês.

Mas, sempre que passo por ela estou a caminho do supermercado, que vende flores a preços indecentemente baixos, levando apenas cartão de débito no bolso e, às vezes, quando me lembro, uma sacola ecológica que enfeita o gancho da parede da cozinha. Sinto essa urgência de parar e me desculpar com a senhora corada, que usa tamancos e avental, por não trazer dinheiro comigo e não comprar suas flores e pedir que ela não vá embora, que fique no bairro, emprestando seu ar de outros tempos à minha vida, para que eu possa dizer com orgulho que, apesar da internet, dos smartphones e dos cartões de crédito, no meu bairro tem uma florista.


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